27 November 2009

CECÍLIA MEIRELES


" . . . Às vezes abro a janela e encontro o jasmineiro em flor. Outras vezes encontro nuvens espessas. Avisto crianças que vão para a escola. Pardais que pulam pelo muro. Gatos que abrem e fecham os olhos, sonhando com pardais. Borboletas brancas, duas a duas, como refletidas no espelho do ar. Marimbondos que sempre me parecem personagens de Lope de Vega. Ás vezes, um galo canta. Às vezes, um avião passa. Tudo está certo, no seu lugar, cumprindo o seu destino. E eu me sinto completamente feliz.              Mas, quando falo dessas pequenas felicidades certas, que estão diante de cada janela, uns dizem que essas coisas não existem, outros que só existem diante das minhas janelas, e outros, finalmente, que é preciso aprender a olhar, para poder vê-las assim.  (A ARTE DE SER FELIZ - Cecília Meireles )

23 November 2009

SILÊNCIO

por Ana Veet Maya
Eu não quero este clarão.
Não quero a luz que me cega
Deixa-me apenas calada
Entregue às brisas sutis
Da solidão que me cerca.
Dá-me somente a poesia
Das frestas escondidas na sombra
Das teias secretas tecidas
Na mente dos que nada querem.
Dá-me apenas silêncio
Veludo acalenta e acalma
O toque sereno do negro
Esfria e cura minh'alma.


(poesia resposta)
Deusa do Amor Sem Fim...
Luís Rocha


Aos relâmpagos e clarões
No deserto da escuridão fria
Dessas tristes noites vadias
De extravagante beleza
Dar-se-ia sinais de amor
Ao vento sul
Suor, gemidos e sussurros
Emoldurando a imaculada imagem
Da incessante paisagem
Presa à engenhosa memória
Desfazia-se em múltiplos orgasmos
Lindos corpos sob o céu opaco
Sacudindo dentro de si a exuberante sensação do porvir
O voyeur enfeitiçado com a louca desenvoltura
Da fascinante mulher madura
Suplicou aos seus pés
Leve-me para seu esconderijo
Dê-me sem freios e com abundante saliva
Sua língua quente pelo meu corpo aflito
Alimente o meu desejo de vê-la por mais uma vez despida
Cheia de sedução como a lua....
Tu és a definição exuberante da beleza feminina
Curvas que queimam a imaginação dos amantes e delirantes poetas,
Elaborando o orgasmo sem fim...
Dentro dos alicerces sutis
Das insaciáveis alcovas sem vozes.
Cheirando a perfume de flores jasmins.
(visite a página de LUÍS ROCHA : http://www.myspace.com/luiscezar )

23 September 2009

SOBRE O NADA

por Ana Veet Maya

Um pouco mais do azul
Pitadas de bom humor
A voz do amigo na porta
Azeite grego na endívia
A fumaça se perde no além
É prece que sobe ao céu
E eu contemplo o nada...
Brancas nuvens que passam
e mostram que há movimento
O canto do hino relembra
Saúda minha liberdade.
Há calma: o gato não mia
Só olha, escuta, indaga
Silêncio que a alma repousa.
E o corpo se embala ainda
Palavras se calam perdidas
E o sonho... que sonho é esse?
É mel e escorre da boca
Lambuza o peito gelado.
Na noite eu brinco, disfarço
E esqueço que vou acordar...

17 September 2009

PROMESSA

por Ana Veet Maya

Hoje não vou esperar
Nem olhar tua fotografia
Vou encher a cadeira vazia
E nem sequer pensarei em ti.
Prometo não vou chorar
Nem mesmo vou me lembrar
Do doce sabor do teu beijo
Não sentirei nem desejo
Da lembrança cruel do teu toque.
Hoje prometo viver
Somente o instante perdido
Da paz roubada do além.
Hoje não quero ninguém.
E vou colorir os meus olhos

E meu coração tão cansado
De tudo esperar paciente.
Hoje serei só contente
Sorrirei cantando pro céu
Andarei meus passos bem cegos

Pra nada poder encontrar
Nada que tenha perdido.
Quero as lembranças no fosso
Ao lado da tua memória
Que enterro profundo na terra
Nas entranhas do morto passado.

14 September 2009

DE BEM COM NOSSA HUMANIDADE

por Ana Veet Maya

As perdas que temos ao longo da vida e o sofrimento que acumulamos, podem desenvolver em nós uma necessidade imensa de fazer tudo sozinho, mostrar ao mundo inteiro que somos autossuficientes e não precisamos de mais ninguém porque nos "bastamos".

Independência, autossuficiência, autonomia, são de fato qualidades. Mas não devem ser barreiras para a comunicação e o ato de compartilhar, socializar.



Num mundo de competição total, o valor do outro pode te causar ciúmes, inveja, sentimento de inferioridade. E se o outro souber vender melhor suas próprias " qualidades", você poderá perder o seu lugar para ele... Parece mesmo que os que brilham mais,conseguem as melhores posições e aparentemente, são sempre os mais bem sucedidos em tudo.

E é nessa base de competição que pode se desenvolver o nosso orgulho, como uma forma de auto-defesa.

Quando temos dificuldade em delegar, partilhar, compartilhar e queremos fazer sempre tudo sozinhos, sem pedir ou mesmo aceitar ajuda, buscamos superar os nossos limites e nos sentir  fortes.

E queremos essa sensação de força, exatamente porque por dentro, talvez nos sintamos ainda fracos, frágeis, vulneráveis.

O que já é, não precisa ser testado nem provado. Já é. Fim.

O orgulho vem disfarçado com outros nomes : eficiência, certeza, firmeza, independência, competência . . .

Você pode ser bom e fazer bem e ao mesmo tempo, compartilhar, delegar, dividir, vibrar e estimular o brilho do outro também! Não precisa ocupar nenhum pódio. Não precisa competir.

Quem sabe possamos parar um pouco e pensar em :

1- Não dar tanta importância para aquilo que enxergamos como verdade. Tudo e nada é verdade. Podemos abrir espaço para outros caminhos e formas de pensamento e ação.

2- Ter consciência dos fatos, mas sem o julgamento eterno, "isso é certo", "isso é errado". Haja espaço para a dúvida!

3- Parar com o sentimento de fatalidade. Tudo é mutável e passageiro.

4- Não ter o foco apenas no problema e no erro. Vamos focar os acertos.

5- Desenvolver a coragem para mudar, nos libertar de padrões de comportamento viciosos e poder testar conceitos novos .

Toda vez que fazemos isso, estamos enfrentando o orgulho, diminuindo o nosso ego e aceitando a nossa HUMANIDADE. E aceitar nossa HUMANIDADE significa :

1- PODER ERRAR, porque errar é DE FATO, humano

2- PODER SOFRER, CHORAR, sentir RAIVA e todos os outros sentimentos que todos os HUMANOS sentem, sem que isso nos deprecie, nos torne mais fracos ou menos valorosos que os outros.

3- PODER SENTIR PREGUIÇA, DESÂNIMO, tristeza, sem receber de imediato um rótulo de doente mental ou maluco beleza, porque todos podemos nos sentir melhor ou pior num determinado dia ou situação. Nada é mesmo permanente.

4- E por fim, PODER NÃO SER PERFEITO, porque afinal, a perfeição é DIVINA . . . ( imaginou sua vida sem os desafios. sem as diferenças para superar? Seria muito monótono!)

Ao aceitar a nossa humanidade, sofremos muito menos, nos tornamos mais saudáveis e felizes.

Se somos mesmo feitos a imagem e semelhança de Deus, a perfeição chegará a seu tempo.

Fiquemos portanto de bem com a nossa humanidade!

( agradeço a inspiração do texto, ao chat profundo e enriquecedor com o amigo Camilo do México )

11 September 2009

NAS ENTRELINHAS DO TEMPO

por Ana Veet Maya


É noite.
Olho para todos os lados, mas não tenho olhado a terra.
O céu me atrai.
Minha mente divaga ao contemplar estrelas.
A beleza, o brilho, a distância, o mistério da noite...
E ele - sempre imenso e profundo - o céu: cenário essencial do teatro da noite... 
O céu: a testemunha silenciosa de todos os encontros e despedidas.
Lágrimas, desespero, bebedeiras, promessas, desesperança, tentações, prazeres, sensações. 
Todas as sensações. 
Parece que os grandes prazeres são reservados para a noite.
Às vezes tenho medo da noite.
Meu medo só não é maior do que a minha atração.
E as paisagens se sucedem NAS ENTRELINHAS DO TEMPO.
Sombras e luz.
Mas são em maior número as sombras... 
Porque as luzes fogem da noite.
A noite gosta do vermelho do veludo e do toque do cetim. 
A noite gosta da seresta e muita festa.
Será que a noite gosta de mim ?
O farol de um carro à distância. 
E já passou.
Vagalumes na estrada. 
O cheiro da dama-da-noite. 
E já passou também.
Tudo passa muito rápido... 
E eu nem sentí o dia passar.
Nas entrelinhas do tempo, posso fazer minha vida inteira caber num dia.
Mas a noite é incomensurável...
O riso dos meus filhos no banco de trás do carro. Agora o riso dos sobrinhos e dos netes...
O latido do cachorrinho. O miado do gato.
Aquela casa com chaminé.
A fumaça nos mostrava a vida que buscava o céu.
O forno-a-lenha, o café, um cheiro de conforto e cotidiano. 
E eu cigana, minha família de sangue e a família inteira do mundo.
Somos todos viajantes da noite nas entrelinhas do tempo.
Novos caminhos, novas culturas, faces, preceitos, preconceitos, acidentes de percurso, as curvas do caminho e as retas. 
Sim. Há retas!
E são muitas as planícies. 

Nas entrelinhas do tempo, nesta vida, superei barreiras e ultrapassei fronteiras.

Um amigo me diz que vive agora a sua solitude: solidão com atitude.
A noite estimula atitudes.
Mas muitos, à noite, só querem entorpecer seus sonhos.
Eu gosto de clarear a noite.
Com neon. 
Com frisson. 
Com aventuras e descobertas.
Com a alegria de quem gosta de partilhar.
A noite inspira e encobre risos e lágrimas.
Vivas à noite, mãe das esperanças, babá dos sonhos que insistem em nascer. 
Palmas para a noite que acalenta novos amores e abriga poetas chorosos dos amores perdidos.
Glórias à noite que deságua no dia, que deságua na tarde e deságua novamente na noite, destino certo de todos os que amam a luz.
Compreendo os ensinamentos nas entrelinhas do tempo...
É noite. 
Há tempo!
Beijo o invisível que vê o meu coração.







8 September 2009

CAPS AD PENHA

por Ana Veet Maya

Os sonhos ainda não acordaram totalmente.
Bocejo e olho o céu.
A nuvem escondeu o sol. A semana começou chorando.
Dirijo para o trabalho e encontro pessoas sonolentas pelo caminho.
O fusquinha vermelho não consegue quase subir a ladeira da Penha.
Do alto a igreja me observa resplandecente.
Deixei o Lundy, o Temaki e a Matilda sozinhos.
Até cães e gatos se entendem. E por que nós não nos entenderíamos?
Abro o portão do meu trabalho com a alegria de poder começar mais um dia útil.
Os pacientes já aguardam o doutô Guilherme, meu amigo Bubby, o Chef Guilherme Tell!
Foi o doutô que pagou o nosso pãozinho da manhã.
Sete horas.
Sentamos juntos e tomamos nosso café. 
Somos uma família!
Não rezamos o Pai Nosso, mas nossa amizade é uma forma perfeita de oração.
Irene fez o café e ao lado de Elaine começa a limpar todas as frestas e cada vãozinho escondido.
Graças a elas, o ar entra.
Silvana atende com boa vontade e dedicação a todos os pacientes.
Ela está preocupada e cuidando dos dentes.
Ela é bonita e tem um sorriso lindo.
Anda meio triste por causa do amor.
É mesmo muito difícil dizer adeus, Silvana.
Bruna, a loira e jovem guardiã de nossos documentos e nossa vida administrativa, alimenta nossos peixinhos. 
Eles enchem de vida este ambiente hostil, onde as neuroses, as manias, as psicoses e todas as pequenas e grandes loucuras se mesclam com a loucura do cotidiano de cada um de nós.
A Joyce ficou falando comigo no MSN o final de semana inteiro, sempre bebendo sua Salton... 
Gosto dela porque quando conversamos, seu coração chega sempre bem pertinho do meu.
Daqui a pouco chega a doida e querida Dudu, a nossa "chefe".
Devagarinho, com a sabedoria de quem tudo sabe e nada vê, ela trouxe paz e amizade para toda a equipe. 
As pessoas se sentem mais tranqüilas, apoiadas, sem tanta pressão. 
Afinal, já que não há dinheiro, há que se ter prazer.
Não temos aumento há mais de dez anos.
Atendemos a dependentes químicos que nos procuram em surtos medonhos.
A Sueli atende comigo os jovens infratores.
Estamos escrevendo um dicionário da gíria dos jovens manos para conseguir entendê-los melhor.
Sueli consegue compreender a todos muito bem. Uma menina ruiva, doce e responsável.
Aprendo muito com ela.
O meu querido amigo Guilherme trouxe o CD de Ila Maria.
A música maravilhosa de filmes do passado inunda de poesia o nosso ambiente.
Parece que só ele e eu conhecemos essas músicas e esses filmes.
Estamos envelhecendo. Acho que só nós dois estamos, Bubby! hehe
Quero morrer fazendo arte ! Porque a arte salva!
Daqui a pouco a Rosana usará esta sala e essa música calará e dará lugar a desabafos e lamentações sem fim.
Tomara que nenhum paciente venha sob efeito de nenhuma droga ...
No último surto, machuquei meu braço segurando a fechadura para que nosso paciente não irrompesse com violência o salão de atendimento e não quebrasse a televisão que ganhamos de doação do meu amigo Sérgio Big.
A maçaneta da porta quebrou exatamente no momento que o segurança chegou, mas a televisão ficou intacta. Uff!
A Rosana é minha mana de escorpião.
Menina sabida, doce e oportuna. Ela anda bonita de fazer gosto. Comprou seu apartamento. Novos projetos, nova caminhada. Boa sorte, Rosana!
A mana Cris Viscome me faz uma falta danada. Gosto tanto dela!
Trabalhamos em períodos diferentes. 
Ela é educadora como eu, tem uma paciência infinita com todos.
Quando surtamos juntas, brigamos sem parar. Mas nos amamos de paixão!
É tudo muito divertido.
Ao lado de seu marido motociclista, ela atravessa corajosamente o mundo.
E esse coração cigano ensina muito a todos nós.
A Inês se adaptou muito facilmente ao nosso trabalho e integra bravamente nossa equipe desde que a querida Marta se aposentou.
Quase trinta anos de trabalho social ao lado dos casos mais tristes, homens e crianças de rua, dotaram minha amiga Inês de um positivismo, uma paciência e uma coragem impressionante para enfrentar o novo. Ela nem sabe direito, mas a admiro muito.
O Dr.José Carlos, nosso clínico geral, ensinou-me muito sobre o Chile. Um verdadeiro guia.
Ele trata de fato os pacientes e se preocupa, pesquisa e acerta. Roqueiro esse dotô!
Saudade da Ivana e seu riso solto. Seriedade precisa. Que pena que se afastou de nós. Mas a saúde em primeiro lugar.
A Juliana e o Júlio somam com esta equipe de doidos e parecem que começam a entender esses nossos mecanismos e engrenagens que necessitam de graxa, mas não há graxa! Nem azeite... Cacetada. 
E agora dotô?
Falta muita coisa aqui: segurança, material, funcionários, apoio à saúde mental...
Mas há a beleza da Letícia.
E há a força severa da Sandra.
Como é bom conviver com pessoas do bem.
Só mesmo pessoas especiais para trabalhar com tanta miséria, doença, desassossego e desilusão.
E eu iludo a pobreza e disfarço a tristeza, fazendo arte, pintando a vida, escrevendo os contos que algum dia falarão por mim.

7 September 2009

PARA NINAR O MEU QUERIDO AMOR

por Ana Veet Maya

Eu hoje cantarei
Um canto de paz
Só pra fazer ninar
O meu querido amor

 E meu canto falará
De alegrias e paisagens
De todas as possibilidades
Só de encontros e chegadas.

 Cantarei um mundo bom
Onde todas as sombras
Não encobrirão a luz do azul
Apenas descansarão os olhos fiéis.

 E este meu canto
Falará de saúde e vitórias
De sorrisos, vivas e glórias
Caminhos abertos para o meu bem.

E a justiça triunfará
E o amor sempre vencerá
Porque só bondade e pureza
Guiarão a todos nós.


25 August 2009

PASSADO

por Ana Veet Maya

Eu te quis assim
Como uma brisa fresca
Que aplacava o suor
Do corpo cansado
E sangrento de luta.

Eu te quis assim
Como a mordida da maçã
Que adoçava a minha boca
Antes amarga e seca
Por tanta desilusão.

Eu te quis assim
Como quem nada queria
E apenas esperei
E contemplei o azul
Que era negro e rubro também.

Eu te quis assim
Como um doce raro
Um manjar divino
Que saboreei antes mesmo
De provar.

Eu te quis assim
Sem nada pedir
Sem nem te sentir
Porque pensei conhecer
A beleza do teu ser.

Eu te quis assim
Simples e puramente
Silenciosamente
Sempre enamorada
Da força do homem que és.

17 August 2009

LÁ NA FESTA DO DUDU

por Ana Veet Maya













Muita cerva teve bolo
Farofada com sagu
Gente muito animada
Lá na festa do Dudu

A vampira chupadora
A noivinha um xuxu
O mecânico atrevido
Lá na festa do Dudu

O polícia e sua revista
O Caveira, o Rock e o nu
Gourmet, toureiro e o Sherlock
Lá na festa do Dudu

A Chiquinha irritada
Com o Chaves e seu xabu
Teve o Jason atordoado
Lá na festa do Dudu

Teve eles, teve elas
Teve nós e muito angu
Um bafon muito fervido
Lá na festa do Dudu

A Quitéria e a galinha
Oferenda pra Omulu
E o riso correu solto
Lá na festa do Dudu

Teve bocas bem pintadas
Muito peito, bunda, cu
Muitos corpos definidos
Lá na festa do Dudu

Se você ficou chapado
E se ouviu da vaca o mu
Você já foi batizado
Lá na festa do Dudu

Onde todos são bonitos
Onde o A é ióuuuuuuuu
Amizade musicada
Lá na festa do Dudu!

Se você perdeu , coitado!
Ache a rima para o u
Nosso encontro tá marcado
Lá na festa do Dudu

6 August 2009

SOL


Pele branca
Um cetim
Boca rubra
De carmim
É mulher
E é menina
Energia
Que fascina
De dia fala de cura
À noite leva à loucura
Os corações que procuram
As seduções da cigana...
Pois que ela sabe encantar
É serpente que dança
Despertando o prazer...
Pobres lobos solitários
Pobres cegos indolentes
Se iludem confundindo
Imaginam que a tem...
Livre chama doce Sol
Fera forte e brejeira
Tua vida é de luta
A vitória é certeira.
Não te assustes com a tristeza
Pois que tudo vai e vem
Nesta vida de incerteza
Sempre é certo um novo bem!



Um beijo de amor

Ana Veet Maya
(para minha amiga SOLANGE, reikiana, bruxa, fisioterapeuta maravilhosa, com meu agradecimento por tudo que está me fazendo!)

4 August 2009

A DOR DA SEPARAÇÃO

por Ana Veet Maya


Não dá pra gente medir a dor, dá?
Cada um sente dor de um jeito.
E existem muitos tipos de dor.
Muitas poesias que escrevi falam da dor da separação.
Quando sentimos dor, não nos importamos de ser ou parecer "bregas".
Queremos (e precisamos) apenas desabafar...
Minha avó me dizia que um amor a gente "sara" com outro.
Amigo que me lê, se você neste momento está se sentindo sozinho, sem amor, sofrendo a dor de uma separação, vai fundo. Não fuja desse sentimento.
Permita que sua dor se manifeste!
Chore, grite, tente, faça tudo o que seu coração mandar E QUE NÃO CAUSE DOR A MAIS NINGUÉM, 
MAS PERMITA-SE EXPRESSAR!
E tenha certeza, meu amigo, isso também irá passar...
Eu que também já passei por isso, sobrevivi.
Gosto de acreditar nas possibilidades.
Vamos manter nosso coração aberto e quentinho.
Bom dia e abraços solidários e afetuosos pra você que sofre neste momento a dor do coração partido!
anaveetmaya
abril de 2013

A SEPARAÇÃO
anaveetmaya
poesia escrita em 2008



Sim.
Talvez eu seja louca.
Completamente louca talvez.
Irremediavelmente louca.
E é assim loucamente
que eu o desejo querido.
Mas deito na cama vazia
e acordo perdida sem você.

Sim.
Talvez eu seja louca.
E louca sei: caminharei só.
E esperarei por seus braços
que sinto nunca chegarão
e o seu corpo sedento
eu sei não irá me aquecer...
Por que não estás aqui meu amor?

Sim.
Talvez eu seja louca
e queira gritar por tua boca
imaginar nossa vida possível
acreditar nosso amor bem real
e alegre nossa casa, nosso dia...
Tão loucas possibilidades
Que se perderam vazias.

Sim!
Talvez eu seja louca
Porque mil vezes só sua eu seria
e mil vidas eu louca te daria
pra sermos louquinhos assim...
E pra sempre serias bem-vindo
E eu olharia o céu só sorrindo
da loucura que o une a mim...


24 July 2009

Ó DEUS, LIVRAI-ME DAS BOAZINHAS!


Ó DEUS, LIVRAI-ME DAS BOAZINHAS
por Ana Veet Maya
Desde pequena eu sempre duvidava daquelas matronas com cara redonda e com bigode, que me apertavam a bochecha e me diziam cuspindo:  
- Que lindinha!

Algo no ar soava falso, formal, obrigatório e eu detestava!

E os sermões tradicionais que elas davam e que sempre começava por “... menina pode, menina não pode...” ?
Eu rejeitava. Algo em meu peito gritava e me diziaque não era bem assim...

Cresci vendo algumas mulheres falando mal de outras tantas.
Meu pai e minha avó diziam que mulher muito sorridente não era séria e que a gente deveria se "conter".
E eu na minha ingenuidade, percebia que as sorridentes eram bem mais bonitas... 
E depois, quando cresci, percebi que as sorridentes eram bonitas e mais sexy também! 

Talvez, por serem invejadas, eram vítimas da maledicência das outras mulheres que não ousavam tanto quanto elas?

Penso que a "diferença" atraía o olhar e a cobiça de muitos homens. 
E essa atenção feria a autoestima de algumas "esposas", talvez mais carentes por não ter a mesma atenção.
Naquele tempo, a esposa era a "do lar".
O prazer, oras, o prazer o homem buscava na rua...

Eu tinha uma tia que era bem baixinha e amorosa com todos, mas super reprimida pelo marido. 
Ela era tão subserviente que se deixava literalmente fazer de escrava. 
Andava a pé só pra economizar. 
Não comprava nada para ela, só para ele. 
E até mesmo a comida melhor era sempre pra ele. 
Muito contida, nunca se queixava.

Mas bastava estar num evento de família e tomar uma caipirinha, que a vergonha sumia e a língua soltava...
Começava então a brincar com os tios, a elogiar o churrasco e a linguiça do churrasqueiro... 
Eram brincadeiras ingênuas da época mas que revelavam muitos desejos guardados e verdades escondidas...


Enquanto titia economizava e andava a pé, o marido gastava tudo com a amante... 
E todos da família sabiam! 
Aquela verdade velada e disfarçada que ninguém falava na frente, mas falava sempre pelas costas... 

Aqui cabe uma reflexão. 
Parece-me que algumas “esposas” acabam pelo cansaço promovido pelo excesso de atividade e “obrigações”, entregando-se a uma forma de desleixo... Já as supostas “amantes” parecem ter mais disposição e energia e se mostram mais cheirosas, cuidadas e disponíveis... 
O que você acha?

Tinha também uma tia que morava no litoral e que era linda linda.
De todas as que eu conhecia, era a mulher que usava os melhores perfumes, os melhores vestidos, jóias e sapatos de salto alto. 
Usava batom vermelho e vestido bem acinturado.  
Algumas mulheres da família, não tão bonitas, algumas mais gordas, outras que viviam com avental sujo de gordura, conversavam entre si e diziam assim:
- Ela é mulher fácil. Ela é mulher "da vida".

Hoje eu analiso que essa tal fama,  vinha do fato dela ser muito feminina e sexy e atrair a atenção de todos. 
Pela “diferença”, ela pagou esse preço de ficar “mal-falada”.

É muito comum para alguns, dizer que é errado aquilo que não tem, aquilo que cobiça  ou o que não entende.

Enquanto essa tia fazia penteados e usava laquê cheiroso, algumas só podiam usar laquê de “cerveja”, com cheiro ruim e característico...

E ela também tinha lindas bonecas na cama. 
Naquela época eram chamadas de “boneca dorminhoca” e ela tinha de todas as cores.

Num tempo onde nem as crianças tinham muitos brinquedos,fica mais fácil entender a inveja e a maledicência dos que não tinham o que ela tinha... Inclusive, dos que não sentiam o prazer que ela sentia e que mostrava na face sorridente sem pudor!

Eu amava visitá-la.

Podia brincar com as bonecas. 
Ela me passava perfume e me deixava passar batom!

Eu a admirava e pensava: 
- Quando crescer quero ser como ela!

E na escola?
Quem não teve uma amiga da turma do fundão? 
Aquela que todos os professores gostam de chamar e dar bronca e sermão?

Eu também tive! Ela cabulava aulas para ir namorar.
Enquanto a maioria de nós ainda não tinha dado o primeiro beijo, ela já beijava de língua! 
A gente a ouvia extasiada!
Enquanto nós e outras amigas ficávamos no recreio comendo nossos lanches engordativos, ela encontrava um cantinho escondido no pátio da escola, só pra ficar beijando o namorado! 

Ela era tão linda. 
 E ela fazia coisas audaciosas! 
Ela enrolava a saia de uniforme na cintura, só pra ficar curtinha.

Ela nem sabe que assim ousada, inspirou a imaginação de todas nós!

Mas algumas mamães mais medrosas e inexperientes, alertavam as filhas e diziam: 
- Não ande com ela! Ela é má influência, ela é mal-falada!

Interessante. Parece que é mais fácil criticar, julgar e excluir, do que ensinar os filhos a aprender com a diversidade...

E enquanto nós aprendíamos sobre amor, romance e sexualidade lendo as revistas da época, ela aprendia exercitando ao vivo, aproveitando bem a sua meninice e depois, a sua adolescência.

Nesse tempo também aprendi sobre a inveja.

Porque eu via que era comum as minhas amigas menos cuidadas, com pernas sem depilar, falar mal dela e dizer que ela não prestava...

"- Beleza não vai na mesa." Dizia minha avó.

Lembro-me também de uma professora que tive no segundo ano do primário.

As mães comentavam entre si: 
- Não deixe sua filha cair com ela. Ela não presta! Ela tem má-fama!

Hoje eu entendo por quê falavam isso... Essa professora era linda e loira, de cabelos compridos e sempre cheirosos, batom vermelho e sempre muito bem arrumada. Foi uma das mulheres mais carinhosas e femininas que conheci. 

Hoje compreendo por quê a independência e a liberdade dela incomodava tanto às demais mulheres, que ainda não trabalhavam fora e que viviam como secretárias do lar.

Parece-me que muitas vezes é mais fácil criticar e condenar o outro, do que aprender, mudar e ir à luta.

Essa professora era a única que usava delineador nos olhos. 
E puxava um rabinho muito bonito nos cantinhos, o que a deixava muito atraente.

Hoje em dia, ao lembrar dela, tenho certeza que ela sentia prazer! 
Porque naquele tempo quando ninguém ainda sabia o que era orgasmo, ela já falava em sexo e tinha cara de quem acabara de gozar: sempre um sorriso matreiro na face.

Em tempos nos quais poucos sabiam sobre prazer e sexualidade, muito natural que ela fosse discriminada e igualmente “mal-falada”...

Lembrei-me agora daquela amiga de vinte anos, loira, linda, sexy. 
Tão “quente”, tão assanhada, que brincava de se roçar até com o câmbio do carro!
Ela fora mãe ainda muito nova. 
Aos vinte, ainda sentia-se em plena adolescência. 
Com uma filha pequenininha, explorava e tentava aprender com a vida tudo o que pudesse, para ser mais feliz e sentir-se realizada em tudo, inclusive sexualmente.
Afinal, a maternidade precoce acrescentara muitas obrigações na sua jovem vida.

E como ela explorava tudo e tentava de tudo, nem sempre tão cautelosa pra esconder seus atos da sociedade, ela também adquiriu “má fama”.

Parece-me que é comum que algumas mulheres que não tem prazer, nem o sexual, critiquem e condenem quem tenta, quem ousa e investe sem ter medo de mudar.

Afinal o “até que a morte nos separe” ainda está bem grudado na nossa memória católica.

Eu tive um amigo que gostava de falar que mulher não gosta de “homem bonzinho”.

E eu, sempre uma livre-pensadora, pergunto-me se homem gosta de “mulher boazinha”?

Percebo casamentos tradicionais que mantém apenas a “fachada”, enquanto os homens, escondidinhos (ou não tão escondido), buscam prazer e mais alegrias nos braços das amantes, conhecidas por não serem tão “boazinhas”.

E leia-se aqui como “boazinha”, a mulher que fala “sim” em detrimento de seu próprio bem-estar e seu prazer, muitas vezes apenas pra manter  um casamento, para ter ao seu lado um homem "pra chamar de seu"... Um homem que talvez nunca a tenha amado de verdade...
Será?

Penso que quem ama respeita!
Quem ama, entende, não condena, não julga.
Quem ama, soma, faz, pede! Não manda, dá exemplo e compartilha!

Será que vale a pena viver mentindo, enganando a nós mesmas?
Será que é certo o ditado que diz “antes mal acompanhada do que só" ?

Onde está o certo. E onde está o errado?

Mas eu gosto de refletir. 
Somos responsáveis por nosso sim e pelo nosso não.
Podemos aprender com nossas escolhas, acertos e erros.

Não é bom ser "rotulada". O rótulo exclui possibilidades. Desintegra ao invés de somar.

No jogo eterno homem X mulher, muitas que carregam o rótulo de “safadas”, tem a preferência nacional...

Mas muitas vezes a mulher que alguns homens preferem na cama, não será a que ele irá apresentar como “esposa”. Foi assim no passado e continua assim no presente.

As mulheres que conheci no passado e que tinham rótulos de mal-faladas, eram mulheres bonitas, sensuais e mais resolvidas. 

As que tinham fama de “boazinhas”, eram menos femininas, menos cuidadas, menos felizes no casamento e também as mais autoritárias e juízas das outras que estavam com o prazer em dia.

Assim o “sistema” vai perpetuando suas falhas e a maledicência e a inveja parecem nunca ter fim.

Já carreguei e ainda carrego vários rótulos.
Para uns, sou polêmica. Para outros sou ousada. Para outros, mal-falada... hehehe

E você? 
É "boazinha"? É "mal-falada"?


Onde me apresentarem um juízo de valor, questionarei e buscarei a verdade!
Eu só sei que nada sei...
E sigo pela vida sempre uma aprendiz.

Ó Deus! Livrai-me das “boazinhas” !
anaveetmaya

(Ó DEUS, LIVRAI-ME DAS BOAZINHAS - escrito em 2008- Ana Veet Maya)





29 May 2009

SALVE VÓ ANNA!

por Ana Veet Maya
Vó Anna.
Mulher guerreira, forte, silenciosa, enigmática.
Cresci vendo vó Anna sorrir. Uma menina. Sorria por tudo.
Às vezes, gargalhava tanto que até chorava e fazia xixi na calça.
Fez-se curandeira na vida.
Atendia a todos da vizinhança aplicando injeções, benzendo cachumba, quebranto, erisipela...
-Ó, Ana, tens quebranto? Tira-te Deus e o Espírito Santo. Dois te puseram, três te tirarão, São Pedro, São Paulo e o apóstolo João. Em louvor de São Silvestre, tudo o que eu fizer pra Ana preste...
E vó Ana, ia rezando e fazendo o sinal da cruz na nossa testa.
Ao final das rezas, ela começava a bocejar muito, muito. Seus olhos se enchiam de lágrimas, ela ficava com o rosto inchado, vermelho.
Bocejava até não mais poder.
Depois, passava a mão pela boca como quem retirava algo nocivo, como se estivesse limpando e jogava fora, rumo ao nada, como se de fato tivesse algo em suas mãos.
Aí, os bocejos paravam.
A gente se sentia melhor. E ela dizia :
- Ai, tininha, precisas rezar ! Você estava com muito quebranto!
Reza pro anjo da guarda.
E começávamos juntas:
- Santo Anjo do Senhor, meu zeloso guardador, se a ti me confiou a piedade divina, sempre me vele, me guarde, ilumine, proteja, amém.
E todos saíamos de perto da vó Anna mais felizes e com o coração aquecido.
Nas tardes de chuva e trovoada, ela pedia que corrêssemos e escondêssemos tesouras e metais.
Cobríamos também os espelhos e ficávamos quietinhos e juntos, vendo a chuva cair até passar.
Os relâmpagos e trovoadas se sucediam.
Tínhamos muito medo.
Vó Anna ia até o fogão e fazia bolinhos de chuva, sempre salpicados com muito açúcar e canela.
Não havia medo que resistisse aos bolinhos de vó Anna...
Ela sempre acordava muito cedo.
Rotina muito simples.
Pedia que alguém comprasse sua bengala de pão enquanto ela passava no saco o “ negrinho” e o cheiro de seu café espalhava-s convidativamente pela vizinhança.
Sempre que eu sentia o cheiro do café de vó Anna, sorria feliz e uma paz muito grande se instalava dentro de mim.
Já sabia que tudo estava bem, o dia inteiro seria bom.
E nada mais me preocupava.
Hoje eu sei que vó Anna me ensinou a meditar e a viver o aqui-agora.
Quando o pão chegava, muitas vezes ainda era escuro, ela se sentava à mesa, cortava metade da bengala, dividia ao meio e passava margarina. Enchia uma terrina redonda inteirinha de café e, lentamente, num ritual meditativo, começava a mergulhar o pão no café puro, comendo devagar, saboreando prazerosamente e sorrindo.
Vó Anna tinha um chá para cada doença.
Suas ervas eram plantadas espalhadas pelo jardim : melissa, capim santo, alecrim, arruda, guiné, espada de São Jorge, hortelã, mirra, malva, erva de Santa Maria e quebra-pedra, pata-de-vaca...
E plantava flores, rosas, sim, muitas rosas e azáleas.
Ela adorava a terra. Adorava plantar.
Vestia sempre roupas bem largas que não marcavam sua silhueta gorda.
No ventre, sempre um avental de cozinha, como se estivesse eternamente pronta para ir ao fogão e fazer seus quitutes.
Lavava as roupas lentamente. Quarava.
Dedicava um tempo especial para escovar os ternos pretos de meu avô Zeca.
Diariamente pendurava os ternos para apanhar ar e sol.
Escovava tudo com carinho, como se estivesse alisando e escovando as costas do meu avô.
Muitas vezes esses rituais de vó Anna eram acompanhados pelas músicas que ela cantava ou pelo barbear de vovô Zeca, interpretando Nelson Gonçalves e Orlando Silva.
Nunca vi vó Anna se queixar de nada.
Nunca.
Ela me dizia :
- Tata, reza, filha. Não chora. Depois do escuro da meia-noite, sempre chega um novo dia.
E ela me ensinou a acreditar nisso porque o dia sempre chegava !
E a lágrima era sempre mais passageira que o sorriso e a paz.
Vó Anna ensinava que com certeza, tudo sempre ficaria bem.
Bastava que assim pensássemos.
Mas ela explicava que precisavamos pensar e fazer.
- Tata, escuta, Deus fala assim , me ajuda que Eu te ajudarei. Se você ficar só se lastimando, nada vai acontecer. Você precisa trabalhar e confiar.
A fórmula de tenacidade de vó Anna ficou encravada na minha formação.
Bastava que não tivéssemos preguiça, que trabalhássemos sempre e mantivéssemos nossa saúde, nosso maior bem.
Foi assim que vó Anna me ensinou a ter fé e nunca desistir.
Teve aquela vez que vi vó Anna desmaiar.
Seu netinho morrera subitamente do coração.
Oscarzinho, menino travesso, inteligente, alma sensível. Um anjinho no céu.
Foi um susto muito grande pra vó Anna.
Nesse dia ela chorou.
Todos nós choramos.
E eu fiquei triste e aprendi que a tristeza também fazia parte da vida.
Mas no dia seguinte, vó Anna levantou e tomou seu café.
Saiu para o quintal.
Olhou o céu.
Parecia rezar.
Suspirou e foi regar as plantas.
E eu aprendi que mesmo com a tristeza, a vida seguia sempre em frente.
E embora triste, estudei, limpei a casa.
Eu sabia que a vida continuaria.
Aprendi com vó Anna que dentro de nós há espaço para todas as emoções.
O corredor de nossa casa era comprido.
Vó Anna gostava de ir até o portão, olhava a rua, varria a calçada, cumprimentava os vizinhos.
Sempre pela manhã.
Começava então a fazer o almoço, feijão, arroz, murinhana, batata frita.
Isso eu nunca aprendi com vó Anna... Minhas batatas fritas até hoje ficam murchas, horrorosas.
As dela eram sempre bonitas, saborosas, sequinhas, deliciosas.
Após o almoço, vó Anna se sentava com seu crochet.
A televisão era ligada nesse momento para os programas femininos da tarde.
Nunca entendi direito como vó Anna conseguia fazer tanto crochet, ver a televisão, rir do que via e ouvia, conversar comigo e ainda me aconselhar...
Enquanto suas mãos e dedos ágeis freneticamente faziam crochet (que minha mãe depois vendia para ajudar no orçamento), eu ficava deitadinha com a cabeça em seu colo ou simplesmente apoiada num travesseiro encostado no seu corpo.
E as tardes passavam gostosas, estimulantes e sempre protegidas.
A primeira infância é mesmo vital para todos nós.
Vó Anna foi um dos grandes pilares que sustentou a minha formação.
No café da tarde, às vezes vó Anna preparava chocolate...
Ninguém até hoje conseguiu fazer o chocolate da vó Anna.
O dela tinha sempre sabor de alegria.
Ela jantava muito cedo.
–À noite não se pode comer, filha!
Após a janta, as novelas pra ela e para mim.
O carteado e o dominó para meu avô.
Vô Zeca era campeão e trazia muitos troféus para casa.
Enquanto eu era a companheirinha de vovó nessas noites de carteado, eu nem percebia o quanto de tolerância, amor e desapego, existia nessa sábia mulher que me ensinava a amar.
E ela amava.
E seu homem era livre para sair, jogar, sabe-se mais o que fazia vô Zeca naquelas noites sem fim...
Nunca vi vó Anna brigando com vô Zeca.
Nunca vi vô Zeca brigando com vó Anna.
Ainda na década de 50, quase virada para 60, vó Anna tinha a ousadia de viver com um homem dez anos mais jovem que ela!
Ela enfrentou todos os preconceitos da época, mas sempre cuidou bem do seu amor.
Vó Anna, uma mulher de vanguarda que de fato marcou a vida de todos que conviveram com ela.
Um pouco antes de ir dormir, havia o ritual da maçã.
Ela parava e guardava seu crochet.
Pegava uma maçã bem doce e vermelha.
Descascava lentamente.
Seus dentes não lhe permitiam mastigar as cascas.
Ela conseguia descascar a maçã inteirinha sem quebrar a casa, para depois mastigar lentamente, pedacinho por pedacinho.
Claro que ela queria me dar pedaços da maçã.
Mas eu não queria.
O óbvio nunca me seduziu.
Eu amava era comer as cascas!
Lindas, vermelhas, fresquinhas, saborosas.
Era muito estimulante aquilo tudo.
Só hoje consigo entender o quanto vó Anna meditava!
Cada ato, sempre consciente, sempre uma grande meditação.
Quando o último programa da noite que eu podia assistir chegava ao fim (porque criança naquele tempo tinha horário para ir para a cama), eu chorava, dizia, não, vovó, só mais um pouquinho!
Minha mãe me pegava carinhosamente, me levava para a cama, meu pai sempre junto, ia me dar o beijinho de boa noite.
Mas eu chorava.
Queria dar mais um beijinho na minha avozinha Anna.
E eles deixavam... E eu ia...
–Tchau, vó ! Até amanhã!
E ela me beijava outra vez, abençoava e sorria.
Aos sábados, nossa, que dia especial !
Era o maior dia de festa para mim e todas as crianças da família.
Vó Anna tinha três irmãs e três irmãos. Tia Elvira, Tia Emília, Tia Cema, Tio Maneco, Tio Artur e Tio Quim.
Todos vinham visitá-la aos sábados, ela, a mais velha, a matriarca da família.
Cada um trazia a guloseima que fizera.
Vó Anna fazia bolo de laranja e preparava o café ou o chocolate.
Tia Berta, casada com tio Maneco, trazia bolo de chocolate e amendoim doce torrado.
Saudade da tia Berta!
E saudade da Leila, da Lucimara, primas queridas filhas de Tia Cema.
A Leila enrolava nosso cabelo, fazia toca para alisar depois, ensinava a gente como cuidar das unhas.
A Lucimara era bem pequena e só queria mamar.
A Ruth, a filha da tia Elvira, marcava com suas artes e novidades. Ruth, da minha infância até agora, sempre uma alma irmã e motivadora. Foi ela que me apresentou as artes e a bioenergética.
E Jurema, a filha de tia Emília, nos falava do censo e concursos públicos. Sempre estudiosa ela.
Ah ! Ela também falava de bailes e namoros. Muitos namoros...
Uma grande comemoração em família.
Todos os sábados! Sempre festa.
Tinha um momento da tarde que duas tias, minha mãe e a vó Anna sempre encabeçando, se trancavam na cozinha e se sentavam em torno de uma mesa com uma toalha branca.
Eu não entendia nada daquilo que estava acontecendo.
Elas diziam:
- Meninos, não façam barulho. Agora vamos rezar.
E a porta da cozinha se trancava.
Nós, crianças, ficávamos do lado de fora, sentados calados, olhando uns para os outros, em silêncio, em prece, em oração e profundo respeito.
Éramos crianças sim, mas já tínhamos a noção dos limites.
Era diferente tudo aquilo.
Inusitado.
Algo que era bom, sabia que era bom.
Mas nós tinhamos que silenciar para entender.
E sentir.
Elas nos diziam que rezavam e conversavam com os espíritos.
Diziam que era uma reunião de mesa branca, para rezar e abençoar as pessoas.
E nós, os pequenos, não podíamos participar.
Só quando crescêssemos.
Foi portanto uma grande emoção crescer...
Nunca esquecerei a primeira vez que pude participar da mesa branca Kardecista que vó Anna conduzia, sempre como médium de ponta.
Tia Emília tinha o dom da mediunidade que materializa.
Tia Cema era médium ouvinte.
Minha mãe doutrinava os espíritos que ainda não tinham enxergado a luz.
Aliás, minha mãe hoje, aos sessenta e oito anos, ainda faz isso, tanto com os vivos, como com os que estão em outras dimensões.
Minha mãe, uma eterna doutrinadora!
Vó Anna comandava e segurava as pontas...
Cabia a ela e seus espíritos protetores, amparar espíritos que necessitassem de luz. E ser enérgica quando precisasse.
Quando vó Anna falava para todo mundo se concentrar e ficar rezando sem parar o Pai Nosso, meu Deus! A gente sabia que a coisa estava séria !
Cada um com seu papel.
Assim fui aprendendo que todos nós temos habilidades.
Que todos nós temos poder.
Mas que precisamos acreditar para ver.
Talvez tenha sido assim que aprendi a respeitar e a abençoar a luz.
E a respeitar e entender a importância das sombras.
Vó Anna sempre ensinou a importância de tudo.
- Filha, você não precisa seguir nunca nada. Siga sempre seu coração. Quando não puder fazer o bem, nunca faça o mal. Isso já é uma grande coisa. E você também não precisa ter religião nenhuma se não quiser. Não precisa participar de nenhum ritual em nenhuma igreja ou templo. Basta você ser boa. E sempre fazer o bem. Em qualquer lugar. A qualquer momento.
- E filha, quem é bom, não precisa mostrar. Seja boa, apenas. Trabalhe!
Hoje percebo que vó Anna não era espírita.
Ela não era católica.
E não era pagã.
Ela era a vó Anna, uma mulher plena.
Um ser humano completo, feliz e apaixonado.
Uma mulher forte que se permitia ser frágil.
Uma mulher simples e feliz.
Alguém que sempre só soube amar e doar.
Vó, eu acredito sim, a vida é eterna!
Onde estiver, escuta, tua neta te saúda!
Salve, vó Anna!

19 May 2009

AS SOMBRAS

por Ana Veet Maya

A luz do sol me cega
Não posso com tanta luz.
A escuridão me acalma.
As sombras me fazem ver
Sempre além.
E a lágrima que escorre
por prazer ou por saber
não molha o travesseiro
mas limpa toda a cama.
A respiração é suave
quando não vejo a luz.
O Sol é muito forte
e faz-me enxergar as fraquezas.
Eu quero o silêncio
das sombras que perdoam.

anaveetmaya

31 March 2009

A JUSTIÇA

por Ana Veet Maya

Tu te afirmas um bonzinho
Mas vou agora dizer
O nome do teu anjinho
É Lúcifer, podes crer!

E a besta poderosa
Que ilude e ludibria
É tua mestra com certeza
Nas tuas farsas e mentiras.

Enganas quando acordas
E tu mentes ao dormir
Tu és farsa pra ti mesmo
E te borras ao tossir.

Tu és ser pestilento
A sarjeta tens por lar
O verme mais peçonhento
Fede menos que o teu ar.

Tu só usas, nada dás
Para ti sempre é inverno
Sem amor e sem verdade
Disseminas o inferno.

E tu ardes sem saber
Que a vida fala e berra
E te cobra humanidade
Inda depois desta terra.

Então, nobre senhor
Já que assim o desejais
Que caminhes pelas sombras
Sejam leves os teus ais

Pois é certo sofrereis
O que aos outros desejais
Eu sou bem abençoada
Por meu Santo e nobre Pai.

Então por hora me calo
Pois a ti não quero o mal
Viva a tua maldade
Cubra tua boca com sal.

Na vida somos espelho
E temos o que plantamos
Justiça é certo, virá
Aguarde apenas, meu velho!

24 March 2009

O NOVO

ana veet maya





Você já comeu

jaca com siriguela?

Eu já.

27 February 2009

MALDITO BENDITO ESCORPIÃO!

por Ana Veet Maya

E eis que vem para o mundo
Nascido do estranho Plutão
Etéreo, volátil, profundo
Maldito bendito escorpião!

Enigma! O olhar nunca nega
Segredos na palma da mão
Problema teu se te apegas
Maldito bendito escorpião.

Altivo, raivoso e sereno
Odeia, abomina a traição
Ferido já injeta veneno
Maldito bendito escorpião.

Nas várias contendas da vida
Justiça ele faz pra milhão
Mas nunca lhe mostre a ferida
Maldito bendito escorpião.

Por muitos julgado culpado
Seu sexo, seu nexo é a paixão
Na cama é deus muito amado
Maldito bendito escorpião.

Desbrava os nós da tua alma
Enxerga no escuro a razão
Cuidado, não pises na cauda
Maldito bendito escorpião.


Louvores ao signo amigo
Que tem o poder e a missão.
E vive entre a luz e o perigo

Maldito bendito escorpião!